Vem aqui olhar pra mim,
achega-te e vê o meu pranto.
São lágrimas que podem não ter fim,
que me envolvem como um manto.
Deixa que brotem, por maior delírio,
revelarem tudo o que têm a mostrar.
Percorre comigo o caminho de martírio
esta provação pra me libertar.
Não quero que as seques, estarás a desprezá-las,
não as encerres pra que o meu coração não as veja.
Nao queiras desse modo mitigá-las
e fazer-me alguém que eu não seja.
Também não as cales num consolo de basta
cego do vácuo em que se tornou o meu peito
compreende a sua raíz no calo profundo
que me faz ficar de fora do mundo.
Chora as minhas lágrimas comigo,
tal pão ou saliva que partilhamos.
Estende-me a protecção do teu abrigo,
diz-me que é juntos que lutamos.
E por favor não me digas que tenho que ter coragem
de pará-las e seguir viagem
que me esqueço dos mortos que não deixo
embarcar prá outra margem.
É certo que assim é
que não os deixo partir de mim
mas eles também querem saber
como são os dias que estou a viver.
Pelo cais vão ficando
a ver as barcas sumir-se na penumbra
Já apenas estão esperando
pela minha alma moribunda.
Peço-te outra vez, Olha pra mim!
Aprende a escutar sem que te fale,
não digas que cale
são os compassos com que nos marcamos,
que nos vestirão até ao fim.
§
Para todos os que não conseguem despedir-se dos seus mortos